segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Idealizei toda a ocasião do nosso pacto de suicídio.
Eu já tinha em mente pra quem enviaria cartas de despedida, mas ainda não sabia como queria morrer. Só sabia que queria que fosse fácil, rápido e, principalmente, indolor. Chegamos à conclusão: opióides injetáveis.
Pra que seja memorável, ainda que eu não saiba pra quem, planejei deixar uma carta codificada, sem tradução, sem que significasse algo. Somente pra confundir.
E se a intenção é confundir, decidi que usarei um vestido de gala azul, longo, brilhante e alugado, bem maquiada, bem bonita. Ele vai usar fraque.
Estarei usando somente um pé dos meus sapatos, que será bota de cowboy. Ele estará usando um pé de meia de cada cor.
O cenário será um hotel bem chinfrim, conhecido aqui como ponto de prostituição. Why not?
Pensei em deixar um mapa e dicas espalhadas pela cidade, numa espécie de caça tesouros que levará ninguém a lugar algum. Isso vai deixar muita gente louca, já que adoram uma teoria da conspiração.
Falei pra reativarmos nossos blogs. Os mórbidos adorarão ler o que os mortos escreveram, tentando fazer ligação entre nada com coisa nenhuma também.
Poderíamos desenhar símbolos nas paredes do quarto do hotel, tudo sem significado. 
Pensando em não deixar os gatos sozinhos no mundo, injustamente os incluí no nosso pacto. Que explicação dariam pra três gatos mortos, um casal vestido elegantemente, num pardieiro todo rabiscado e sem sentido?
Apenas pra fazer da nossa morte um show, atiçar a curiosidade, criar uma lenda. Nada terá ligação com nada. Apenas nosso desejo de morrer. E que mal se divertir uma última vez?
Planejei em todos os detalhes e lhe passei o plano.
Ele disse:
- Fazem 40 minutos que você vem idealizando pra sua morte o reconhecimento que não tem em vida. Você não quer morrer. Você quer um propósito.